Machado
Crônica de Machado de Assis
publicada no dia 23 de abril de 1893
Chronicles, chronicles, chronicles. Machado contava seu tempo, num tempo que não era mais dele. O amanhã fora então traduzido desde ontem: o relógio avançava e avançava, passando sempre pelos mesmos números. Humanidade. Assim, o escritor ainda hoje é capaz de revelar caprichos do dia seguinte. Não sobrevive de memórias. Ganha vida graças à eterna mesmice deste mundo-repetição, de caducos homens que se macaqueiam desde a civilização adâmica.
Machado de Assis capturou o mais sutil do humano: desejos, fraquezas, burrices, humores, paixões etc. Analisou fatos mais complexos, organizações, sistemas políticos, estruturas sociais. Olhos de poeta e mãos de jornalista. “Somos iguais na essência”, disse minha avó à minha mãe e a última repetiu a ladainha para mim. Eu converso com meu gato.
Na crônica do dia 23 de abril de 1893, Machado narra um boato que não sabe qual. Como? Ouvira na farmácia notícia incompleta: algo aconteceria no dia seguinte. O quê, ele não sabia. Mas o fuxico mexeu com ele, com o farmacêutico, com o dia e com a noite. Seria uma revolução?
Ontem mesmo uma suspeita provocou uma guerra; outra levou moedas de países emergentes; outra me fez tomar cuidado com um vírus de gripe que engordava. Na crônica de Machado, não houve guerra, não houve problemas no câmbio de moedas, ninguém engordou de gripe, não houve nada. Só a expectativa de um acontecimento. Machado narra o não-fato com uma linguagem perspicaz e elaborada. Sedução. Sua, sou eu.
Com humor e inteligência, Machado resgata Hamlet e comemora a data de aniversário de Shakespeare. Resume: “tudo são aniversários”. E novamente o relógio avança. Passa das 22hs, não a mesma de ontem, mas talvez similar de amanhã. Convenço-me: “just do it”!
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