Wednesday, November 15, 2006

Five

Olhos d’água. Os motivos que levaram os Espiga a excluírem Amaretto perderam-se entre a poeira levantada. O muro era de uma concretude sem maior. Em sua retidão, o desequilíbrio do vilarejo; em sua altura, a arrogância da família estrangeira. O muro alçou o terror. Sem motivo. Desde quando o medo é bom conselheiro?

Para a surpresa do cientista Jacó, a cidade também aprendeu a falar com base em evidências. Fofoca com substância! A velha gente explorava aspectos da ingratidão, em conversas na calçada, na igreja, no balcão da venda de meu pai. Amareto, que já era bolorenta por falta de assunto, ficou incoerente. Hálito de desconfiança, com café preto ralo. Um bando de pseudo-cientistas amadores com ódio.

O cão estava doente, nada podia reanimá-lo. Eu sabia disso. Rezava todas as noites. Queria paz em Amaretto. Queria a velha cidade, no tempo em que exclusão não era fato. Queria o cão livre na rua, no tempo em que ele tinha teto e não era um palestino mineiro. Sem direito de resposta. Ou de vida.

O cão me apareceu em sonho. “O vazio surgirá como guia”, disse um velho. O cão havia morrido. Eu sabia, ainda em sonho.

- Meu filho!!! Chame um médico!

Na manhã seguinte, eu também não despertei como de costume; estava paralisado. Ouvia todas aquelas vozes. Minha mãe, que me buscava. "Você me ouve?" Meu pai. "Filho, fale com a gente!" A voz do muro. "MMM". A voz do médico. "Fisicamente, ele está bem. Precisamos esperar..." De dona Gorda a gritar com seus filhos. A voz do padre. Nada me resgatava, porque essa busca era minha. Eu precisava entrar em um túnel de saída desconhecida. Enfrentar a incerteza. Viver um período de desligamento e silêncio. Olhos secos.

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